O nível do Lago Guaíba, localizado em Porto Alegre, experimentou uma elevação significativa de 0,42 metros em apenas 24 horas, marcando 5,20 metros na manhã desta terça-feira (14). Devido ao aumento e à formação de ondas provocadas pela ventania, foi necessária a evacuação do bairro Lami, situado na extremidade sul da cidade.
No dia 5, o lago, que recebe água de ao menos seis rios, havia atingido um pico histórico de 5,35 metros. Apesar de ter recuado para 4,56 metros no sábado, dia 11, a retomada de chuvas fortes entre a sexta-feira e o domingo no estado do Rio Grande do Sul, resultou em novas inundações, principalmente nos vales, impactando severamente a região metropolitana.
As ondas no Guaíba também provocaram inundações no bairro Ipanema, com a água ultrapassando o calçadão da orla e invadindo residências. Na zona norte, bairros como Sarandi, Humaitá e Navegantes foram diretamente afetados, além do Centro Histórico, Cidade Baixa, Menino Deus e Praia de Belas na região central da cidade.
Prevê-se que o nível do Guaíba possa alcançar 5,40 metros até o fim desta terça-feira, o que estabeleceria um novo recorde. O Sistema Hidro da Agência Nacional de Águas (ANA), do governo federal, coloca o nível de alerta do lago em 2,5 metros, com inundações ocorrendo quando o nível excede 3 metros.
Os moradores de Porto Alegre têm se desdobrado para erguer barreiras contra a água e resgatar aqueles ainda em áreas de risco. “Estou preocupado porque se for isso, mesmo com essa barreira, a água vai subir”, disse o comerciante Rafael Farina, que observou a água crescer no mínimo cinco dedos, quase cobrindo uma lixeira que ele usa como ponto de referência.
As chuvas persistentes na região contribuíram para o aumento do nível do Guaíba, com especialistas alertando para a possibilidade de a cidade permanecer inundada por até um mês. “O quadro de cheias ainda está em andamento e não há sinal de que será revertido nos próximos dias”, afirmou o professor Rualdo Menegat, do Instituto de Geociências da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Apesar da previsão de que as chuvas diminuiriam a partir desta terça-feira, espera-se que elas retornem na sexta-feira (17) e persistam durante o fim de semana.
As inundações já resultaram em ao menos 147 mortes, e atingem diretamente cerca de 2 milhões de pessoas em todo o estado, com um impacto devastador sobre o setor produtivo.
Impactos na indústria
A Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul (Fiergs) reportou que 91% das fábricas do estado estão submersas, antecipando uma “década perdida” para a economia local.
As indústrias afetadas estão explorando alternativas para mitigar os danos, incluindo o uso de medidas emergenciais adotadas durante a pandemia de Covid-19 para compensar dias não trabalhados. “As empresas não conseguem escoar a produção, outras não recebem matéria-prima e aquelas que não estão afetadas diretamente não conseguem fornecer os produtos. Toda a cadeia está com problema”, destacou Sergio Galera, presidente do Sindicato das Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas e de Material Elétrico e Eletrônico da região do Vale do Sinos, que representa 35 municípios.
Arildo Bennech Oliveira, presidente em exercício da Fiergs, ressaltou a gravidade da situação: “Afora todos os problemas imediatos, a gente dificilmente vai ter inovações, muita gente querendo ir embora, os próprios trabalhadores não se sentem mais seguros”. Ele adiantou que terá uma reunião com o governo federal nesta semana para apresentar uma série de demandas, incluindo a suspensão de impostos das indústrias por três anos e financiamentos do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) diretamente às empresas, sem intermediários bancários, com um bom período de carência.
O cenário desolador reflete a dura realidade enfrentada pela população e pelo setor produtivo gaúcho. As enchentes e o subsequente alagamento de áreas cruciais da infraestrutura industrial têm implicações de longo alcance, não só para o estado, mas para o cenário econômico nacional, uma vez que o Rio Grande do Sul representa 6% do Produto Interno Bruto brasileiro. “O Rio Grande do Sul representa 6% do Produto Interno Bruto brasileiro e 91% do PIB industrial do estado está debaixo d’água”, enfatizou Oliveira sobre a extensão dos danos.
A situação dramática se agrava com a previsão de continuidade das chuvas e dos altos níveis de inundação. Empresas e cidadãos enfrentam uma realidade de incertezas, lutando para preservar o que podem enquanto aguardam soluções efetivas e assistência do governo. As vozes dos afetados ressoam um chamado urgente por ajuda e medidas práticas para mitigar a destruição e fomentar a recuperação.
Este episódio destaca a vulnerabilidade de regiões altamente dependentes de condições climáticas estáveis e a necessidade de preparação e planejamento adequados para enfrentar desafios ambientais extremos.
As histórias dos que estão na linha de frente desta crise, como Aline Teixeira da Silva, dona da metalúrgica TKS, ilustram a luta contínua contra as adversidades. “As máquinas devem estar oxidando mais a cada dia, o que dificulta o conserto. A água nunca havia chegado nem perto lá da fábrica”, lamentou, refletindo a surpresa e o desespero diante da magnitude do desastre.