Juliana Curi
Janira Rocha, advogada e ex-deputada estadual pelo PSOL no Rio de Janeiro, está na mira de uma investigação da Polícia Civil do Amazonas. Documentos bancários obtidos pelos agentes evidenciam que Janira recebeu pagamentos da facção criminosa Comando Vermelho do estado às vésperas da primeira reunião agendada por ela no Ministério da Justiça, em março deste ano.
Recibos apreendidos pela investigação no celular de uma integrante da facção mostram três transferências realizadas por Alexsandro B. Fonseca, uma espécie de “contador” do grupo, para a conta de Janira. Em um único dia, ela recebeu R$ 23.654,00.
Dias depois, a delegação de mulheres estava no gabinete do Secretário Nacional de Assuntos Legislativos do MJ, Elias Vaz. Entre as convidadas recebidas por Elias, uma mulher conhecida como a “dama do tráfico amazonense”. Luciane Barbosa Farias é mulher de um dos criminosos identificado como líder do Comando Vermelho do Amazonas: Clemilson dos Santos Farias, batizado de “Tio Patinhas”.
Luciane participou do encontro como representante da ONG Liberdade do Amazonas, que seria dedicada à defesa dos direitos humanos dos presos. No entanto, há uma linha de investigação também da PC-AM que indica que a instituição seria financiada pelo próprio Comando Vermelho. Documentos contábeis apreendidos da facção indicam pagamentos regulares para a ONG, sugerindo que a organização seria uma fachada para atividades do grupo criminoso.
Quem é Tio Patinhas
Clemilson dos Santos Farias tem 45 anos, e era considerado um dos criminosos mais procurados do Amazonas. Ele foi preso em dezembro do ano passado, e condenado a 31 anos de reclusão pelos crimes de tráfico de drogas, lavagem de dinheiro e formação de organização criminosa.
Além dos crimes pelos quais foi condenado, há relatos da imprensa do estado de que uma série de assassinatos violentos em Manaus teriam sido mandados pelo Tio Patinhas. Ele também é acusado de ter financiado a fuga em massa de mais de 30 presos do Centro de Detenção Provisória de Manaus em maio de 2018.
Luciane, por sua vez, tem 37 anos e é casada com Clemilson há 11 anos. Ela também foi condenada a 10 anos de prisão por lavagem de dinheiro da facção, além de associação para o tráfico, mas responde em liberdade e vem atuando em defesa dos direitos dos detentos.
Quem é Janira Rocha
Janira da Rocha Silva, 61 anos, nasceu em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense. É graduada em História e Direito, e se destaca nas redes sociais como defensora do feminismo, do socialismo, e ativista pelos Direitos Fundamentais e Humanos.
Sua jornada na política começou em 2010, quando foi eleita deputada estadual pelo PSOL do Rio de Janeiro – mas não conseguiu se reeleger em 2014. Em 2021, Janira foi condenada em primeira instância por contratar funcionários fantasmas e exigir que seus servidores devolvessem parte de seus salários durante seu mandato na Alerj, de 2011 a 2014 – num esquema já conhecido como “rachadinha”. Contudo, o processo não chegou a uma conclusão final devido à prescrição das acusações.
Além disso, Janira atuou como diretora de Relações Institucionais do Instituto Anjos da Liberdade, organização acusada de ter ligações com o Comando Vermelho. Mais recentemente, Janira ganhou atenção em mais uma polêmica, ao representar, como advogada, a ex-deputada federal Flordelis dos Santos de Souza, condenada a 50 anos de prisão pelo assassinato do marido, o pastor Anderson do Carmo.
Impactos para Dino
Em tempos de expectativa sobre uma possível indicação para a vaga deixada por Rosa Weber no Supremo Tribunal Federal, o ministro Flávio Dino se vê com a imagem desgastada. A credibilidade do ministro da Justiça vem sendo amplamente questionada por parlamentares da oposição ao governo, que inclusive pedem que a Procuradoria-Geral da República investigue o contexto da visita da “dama do tráfico” às dependências do Palácio da Justiça.
Um dado curioso é que, depois do episódio, as buscas pelo nome de Dino e por “Comando Vermelho” na internet tiveram crescimento repentino de cerca de 75% no estado do Maranhão – reduto eleitoral de Dino. E os impactos negativos podem levar o presidente Lula a acabar indicando Jorge Messias, atual Advogado-Geral da União, para a cadeira no STF.
O Ministério da Justiça, em resposta às revelações, defende que não possuía conhecimento prévio sobre a relação de Janira com o Comando Vermelho, ou sobre os pagamentos que ela recebia da facção.
Flávio Dino tem se manifestado nas redes sociais, afirmando que a presença de Luciane nas reuniões era desconhecida pelo ministério, pois a solicitação para os encontros partiu exclusivamente de Janira, e disse que a responsabilidade era do secretário Elias Vaz, que recebeu a delegação.
Dino também prometeu processar quem o acusar de ter qualquer relação com o crime organizado (post abaixo).
Já Luciane Barbosa nega qualquer envolvimento com atividades criminosas, argumentando ser vítima de uma “criminalização preconceituosa” por ser casada com um detento.
